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Divergências Profissionais

Texto inédito do premiado autor inglês Joe Penhall ganha adaptação e direção acertada de Guilherme Leme

Um texto ambientado num hospital psiquiátrico retratando jogos de poder entre médicos e divergências de diagnóstico teria todos os requisitos para ser técnico, enfadonho e pouco compreensível ao espectador. Não é o caso. Ao assistir Laranja Azul, em cartaz no CCBB-RJ, nos deparamos com o brilhantismo e agilidade da escrita de Joe Penhall num roteiro que discute problemas relacionados à saúde pública e ao racismo institucionalizado.

Num hospital psiquiátrico um paciente negro (Rocco Pitanga) aguarda alta em meio ao fogo cruzado de dois médicos de posições hierárquicas diferentes e diagnósticos divergentes.

De um lado, o médico residente zeloso (Pedro Brício) que afirma ser o paciente esquizofrênico; de outro seu supervisor (Rogério Fróes), preocupado em seguir as regras e regulamentos e diminuir as despesas, que tenta convencê-lo de que o paciente é borderline e, portanto, deve receber alta.

A adaptação de Guilherme Leme e Marcelo Veloso para o texto de Penhall, recheado de jargões técnicos próprios da medicina, com cerca de uma hora de duração, torna o texto mais palatável e compreensível ao espectador, mas deixa algumas lacunas sobre o verdadeiro estado clínico do paciente e não se aprofunda muito em questões pertinentes, como o racismo e a exclusão social, fazendo com que o texto perca um pouco sua força. O foco deixa de ser o estado mental do paciente para se concentrar no embate entre os dois médicos e suas divergências profissionais.

O elenco se apresenta coeso. Rocco Pitanga defende bem o papel de doente mental e se mostra à vontade na personagem. Rogério Fróes e Pedro Brício tem atuações corretas.

A montagem de Guilherme Leme traz uma concepção bem cuidada e muito interessante. Logo na entrada, o público é convidado a vestir jalecos brancos antes de entrar na sala que os transforma em parte do universo proposto pela direção. O ótimo cenário de José Dias - todo branco – nos remete à sensação de assepsia de um hospital e é complementada pela iluminação idealizada em branco, muito bem elaborada por Tomás Ribas. A luz contribui com acerto para as transições de cena embalada por uma trilha sonora perturbadora de Marcelo H. recheada de punk rock.

Enfim, Laranja Azul é um bom espetáculo, onde se propõe um teatro mais sóbrio, feito por gente séria, que busca discutir temas importantes relacionados à sociedade.

Coluna publicada em 02/2010 - Guia da Semana - Artes e Teatro

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