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Mamãe Não Pode Saber

  • Crítica - Fundo do Baú - Alexandre Pontara
  • 29 de ago. de 2008
  • 3 min de leitura

O que de início poderia parecer apenas mais uma comédia besteirol das inúmeras que povoam a cena carioca, nas mãos de João Falcão tem inteligência e engenhosidade na construção de um texto recheado de referências atuais. Quem está acostumado à dramaturgia do pernambucano sabe que João Falcão é um dos poucos autores contemporâneos que consegue dar rapidez, agilidade e coerência a situações que poderiam parecer absurdas, mas extremamente verossímeis nos dias de hoje.

Escrita em 1993, no Recife, e apresentada no Rio em 2002, com grande sucesso, “Mamãe não pode saber” conta a história de uma família esquisita e decadente, que enxerga na matriarca a possibilidade de salvação para todos os problemas. O encontro do grupo com João Falcão não poderia ser mais propício a criação de uma montagem onde 05 atores se desdobram em 12 personagens, num verdadeiro vaudeville de situações burlescas. Este é o grande trunfo do espetáculo que discute de forma jocosa temas como política, padrões de estética e modismos.

O espetáculo é um acúmulo de surpresas e garantia de riso fácil desde a primeira cena. O texto de João Falcão casa bem com o estilo de comédia dos surtados.

Wendel Bendelack está ótimo no papel de Priscila, uma aspirante a modelo compulsiva por comida e doces como a curiosa torta de farinha láctea com cobertura de marshmallow. Wendel se divide também no papel do adolescente Juninho que a cada cena se rende a um novo modismo adolescente, seja o heavy-metal ou a onda EMO.

Nesta remontagem coube a Thaís Lopes interpretar a empregada, o qual defende de forma correta, considerando tratar-se do personagem menos engraçado da trama. Flávia Guedes e o estreante Leonardo Miranda também garantem bom momentos de riso e diversão em seus personagens. Flávia está muito bem no papel da atrapalhada socialite cujo objetivo de vida é o de enganar a mamãe do título e garantir os recursos para resolver o problema das dívidas da família.

A grande estrela do espetáculo é, sem dúvida, Rodrigo Fagundes, no papel de Júlia, a impagável amiga gordinha, daltônica e invejosa de Priscila. Rodrigo - mais conhecido da TV por seu personagem Patrick do Zorra Total - cria uma Júlia rica em personalidade e que causa grande simpatia por parte do público. Dos personagens criados por João Falcão, talvez, Júlia, Priscila e Juninho sejam aqueles que o público venha mais a se identificar, visto que todos, em algum momento de suas vidas, já tenham conhecido um Juninho, uma Priscila e principalmente, uma Júlia, aquela amiga sempre presente e à sombra da mais bonita e popular.

Um dos encantos do espetáculo reside na troca rápida de roupas e personagens da trupe. Um entra-e-sai alucinante num cenário simples e de impacto, assinado por Sérgio Marimba que valoriza ainda mais o trabalho dos atores. Os figurinos idealizados por Helena Araújo e Djalma Brilhante são decisivos para a criação do Vaudeville, apresentando cores quase tão fortes quanto os apresentados nos melhores filmes de Almodóvar. A direção de João Falcão como sempre está precisa, garantindo o tempo certo de comédia, misturando elementos do teatro do absurdo na própria marcação da cena.

Em tempos de escassez de novas comédias, uma remontagem como a proposta por João Falcão traz um certo vigor para uma cena teatral carente de novas propostas. Ainda uma das melhores opções de 2008. Um espetáculo para ser visto junto com a mamãe e a família toda.

Coluna publicada em 08/2008 - Guia da Semana - Artes e Teatro

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Bio

Alexandre Pontara, ou apenasumalexandre como ele costuma assinar, é artista visual, escritor multiplataforma, poeta, ator, diretor teatral e mais um bocado de outras coisas.

Em 2020, em meio a pandemia do coronavírus, assina o roteiro do espetáculo online "Desafio Hitchcock", um formato inovador em linguagem, único no mundo, idealizado pelo diretor André Warwar. Nesse espetáculo, com cortes ao vivo e linguagem que transita pelo teatro, cinema, tv e reality, 7 atores em cena, cada um em sua casa, atuam e transmitem, em tempo real, suas imagens para o diretor, que corta e monta ao vivo. O público tem a ilusão e certeza de que estão todos num mesmo ambiente. Uma experiência imersiva, ao vivo, em tempo real.

Também, em 2020, assina o projeto visual "Entre 4 Paredes", onde através de estímulos fotográficos de artistas e amigos em seu isolamento social, cria releituras em arte visual, com uma potência artística e linkada aos temas contemporâneos. O projeto se transformou em uma exposição na Linha de Cultura do Metrô SP em 2021.

Entre 2018 e 2020, lançou o manifesto transmídia Poética em Transe, em que artistas das mais variadas vertentes dão voz a contemporaneidade da sua poesia e dialogam com os incômodos de uma sociedade midiática. Foi um dos produtores da 1ª edição do Festival Audiovisual FICA.VC, em 2017 no Rio de Janeiro. Entre 2008 e 2011, foi crítico teatral do Guia da Semana.

Como diretor teatral, o foco de sua pesquisa está no trabalho investigativo sobre a interferência da linguagem audiovisual no espaço cênico.

A Cidade das Mariposas, encenada em 2011, marca sua estreia como dramaturgo e diretor teatral. Em 2013, adaptou e dirigiu Fausto Zero de Goethe e assinou a Direção Artística da Ocupação Primus Arte Movimento do Teatro Glauce Rocha no Rio de Janeiro.

Além de Cidade das Mariposas, é autor dos textos teatrais O Mastim, Doze Horas para o Fim do Mundo, O Processo Blake, Entre Irmãos, As Últimas Horas e Man Machine 2.0, das antologias poéticas “Poemas Mundanos”, “Poesia Urbana” e “Sombras” e do roteiro de cinema “Doze horas para o Fim do Mundo”.

Alexandre Pontara

Artista visual, ator, diretor, poeta de mídias interativas, escritor multiplataforma e uma mente digital.

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